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  • Foto do escritorMurilo Patriota

PERSUASÃO E DISCURSO

A importância de adaptar-se ao público


A persuasão é uma das atividades mais comuns da vida social. Pode-se dizer até que o ato de persuadir surge por uma necessidade incontornável de comunicação na experiência de vida em sociedade. Seja na feira ou no palanque, na escola ou no trabalho, com frequência nota-se um esforço, nas interações comunicativas, para convencer o outro do seu ponto de vista.


Este esforço por persuadir nasce naturalmente de um desejo de expressar-se, de manifestar aquilo que se pensa; muitas vezes no sentido de contribuir para a resolução ou compreensão de uma dada questão, para oferecer uma perspectiva ainda não visada ou pela maioria ignorada. Pode nascer também, de um desejo de domínio, de controle sobre a maneira de pensar do seu interlocutor – seja um ou uma multidão – e, nestes casos, temos uma espécie de coação ou constrangimento do interlocutor, ao invés de uma tentativa de diálogo.


Conscientes do poder da palavra, os antigos criaram uma arte a que deram o nome de retórica, cuja função seria teorizar sobre o que é mais persuasivo em cada situação concreta (esta definição devemos a Aristóteles). Não se sabe ao certo quando, pela primeira vez, inventaram este termo – retórica – para se referir a esta arte; mas é certo que provém do nome rétor (aquele que profere discursos para um público com destreza).

Estamos habituados, na vida contemporânea, a uma enxurrada de publicidades nos diversos meios de comunicação, especialmente nas redes sociais. O marketing é hoje, sem dúvida, a forma contemporânea do que era a retórica a 2.500 anos atrás. Juntamente com o algoritmo e os avanços na ciência psicológica, o marketing tornou-se extremamente poderoso e sofisticado porque alia, hoje, os recursos persuasivos com um conhecimento profundo sobre sua audiência (seus gostos, hábitos, desejos, fraquezas). E aqui está um ponto-chave da retórica: conhecer muito bem a sua audiência; não bastam frases prontas, imagens, metáforas, piadas, enfim, tudo o que possa ser mobilizado para simpatizar com seu auditório, se você não conhece previamente o seu auditório.


Mas quem é capaz de conhecer absolutamente um auditório? Ninguém. O conhecimento preciso e exato de um público é impossível; mas a percepção de tendências gerais, gostos, crenças ou opiniões não é tão difícil alcançar. Em termos muito simples e diretos: para persuadir alguém é preciso conhecer seus pontos mais sensíveis. E não é à toa que, dentre as partes que constituem a retórica – argumento, emoção e caráter do orador – é a emoção o ponto mais poderoso e explorado pelos oradores. Na verdade, considerá-los à parte, seria mutilar o todo em que se manifesta o ato do discurso: sempre há uma lógica (mais ou menos rigorosa) no desenvolvimento dos argumentos cuja expressão está sempre dotada de uma carga emocional transmitida por alguém que, em certa medida, representa um papel social específico. O equilíbrio destas três forças torna um discurso realmente persuasivo, ainda que a emoção seja mais explorada.


São comuns discursos em que falta claramente um apoio lógico ou argumentativo e que o principal motor é a comoção. Errado? Equivocado? Não. Um argumento precisa ser eficaz, apenas. Evidente que os propósitos de cada orador serão julgados de acordo com este ou aquele princípio moral como certos ou errados. Mas, falando em termos técnicos, no que diz respeito à retórica, um argumento é persuasivo ou não é; aí reside sua força.


Por exemplo, aqueles que advogam pela causa do veganismo, muitas vezes utilizam imagens de tortura aos animais porque evidentemente essas imagens são muito mais capazes de mobilizar o sentimento e a compaixão de um ser humano, do que uma pesquisa científica sobre os malefícios da carne de boi. Mas, e se um público não se choca com essas imagens? E se, suponhamos um público católico, um ou dois versículos que falem sobre a relação do homem com os animais tenha mais impacto? E se, nem um nem outro, mas justamente uma pesquisa científica seja capaz de persuadir um indivíduo a se converter em vegano? Ainda, uma outra possibilidade, seria a de convencer um público demonstrando como, no Brasil, tem sido mais econômico consumir alimentos não derivados de animais do que o contrário.


Em resumo, cumpre ao orador a tarefa de: traçar as características gerais de seu público; saber mobilizar o sentimento do seu público; partir dos valores e crenças do público, para então chegar aos valores e crenças a que deseja convencê-lo. Todavia, todo esse esforço, pode fracassar. Alguns hábitos e crenças estão fundados de tal maneira que para, às vezes, é preciso uma experiência limite, trágica, para que alguém passe a reconsiderá-los. Mas, sem dúvida, um uso habilidoso e consciente da palavra, a adaptação correta ao seu ouvinte, terá muito mais chances de atingi-lo – ainda que não seja de modo radical, a ponto de levá-lo a tomar decisões transformadoras, mas, ao menos, colocá-lo em dúvida e disposto a reconsiderar seus hábitos.



Murilo Henrique Barrantes Patriota

Mestre em Filosofia pela Universidade Federal da Paraíba, com interesse na área de Filosofia Moderna, Filosofia Antiga, Retórica e Teorias da Comunicação. Atualmente trabalha como Analista de Sistemas na M3CASE - Consultoria em ERP.



A quem se interessar sobre a temática, pode consultar os seguintes textos/autores:


PERELMAN, C. & TYTECA-OLBRECHTS, L. Tratado da argumentação: a nova retórica. Tradução de Maria Ermantina de Almeida Prado Galvão. 3ªed. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2014.

Aristóteles. Retórica. Prefácio e Introdução de Manuel Alexandre Júnior. Tradução e notas de Manuel Alexandre Júnior, Paulo Farmhouse Alberto e Abel do Nascimento Pena. Centro de Filosofia da Universidade de Lisboa. Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 2005.

DORRA, R. La pulsión retórica. Rétor, 1(1), 2011, pp. 1-23.

KENNEDY, G. A. A New History of Classical Rhetoric. Princeton University Press, 1994.

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